quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Pipoca na janela


Texto de Matheus Farizatto

Já ouviu a nova versão do clássico comercial de guaraná? Não? “Pipoca na janela, começa a passar! Pipoca pra cá, é só cê gritar!”. Pois é, acabei de criar!

A inspiração veio durante a volta do trabalho, no ônibus, às 19h15, na semana passada. Nesse horário, a linha Presidente Dutra vem mais lotada que o minúsculo congelador da minha avó com cervejas em dia de churrasco da família.

Com a sorte do acaso que eu não acredito, consegui um banco. Logo atrás de mim entrou uma dúzia de pessoas. Bancos e corredor lotados. O ônibus ainda parado.

- Moça, moça, pede uma pipoca pra mim? - sentada atrás de mim gritou a folgada de blusa azul royal colada no corpo, mostrando os quilinhos a mais em volta do umbigo enorme. Só vi esses detalhes, porque virei pra trás na tentativa de acreditar que aquela mulher tinha mesmo feito aquilo.

Com o ônibus lotado, prestes a sair, essa figura grita através do corredor sem espaço para a mocinha sentada em um dos bancos da fila do outro lado do Mercedes coletivo.

A menina olhou de volta para a royalouca e colocando a mão no peito, perguntou:

- Eu?.

- É, pede uma pipoca pra mim!.

A menina de vinte e poucos anos ficou de pé, colocou a cabeça pra fora da janela do Dutra e gritou para o pipoqueiro na calçada, ainda no ponto de ônibus,

- Moço vê uma pipoca pra mim!.

Então começa o bate e volta.

- Pediu?

- Pedi

- Quanto é?

- Moço, ela tá perguntando quanto é!

- Dois reais, senhora.

- Toma – e passa o dinheiro para a menina, passando de mão em mão entre as pessoas de pé no corredor até chegar à mocinha. Uma nota de dez reais.

- Toma, moço - entrega ela para o pipoqueiro.

- Vixi, não tenho troco – responde o senhorzinho de boné e jaleco branco.

O motorista liga o ônibus para continuar a viagem.

- Rápido, moço! – pede a moça.

- Espera aí ‘motô’ !!! – grita o pipoqueiro para o motorista enquanto conta as moedas na pochete em sua cintura.

- Vamos, moço, rápido!

- Ele colocou sal? – a chata atrás de mim.

- Pede pra ele pôr sal, que eu gosto!.

O pipoqueiro finalmente passa a pipoca para a menina, que passa para a quarentona tarada por pipoca, que pede.

- O meu troco, moça!!!.

A mocinha pede o troco para o pipoqueiro. O ônibus começa a andar. O pipoqueiro passa as moedas pela janela para a menina e ela então entrega para a passageira desagradável.

No final, a mala com a pipoca e o troco na mão.

- Obrigada, filha. Ele colocou sal? Ah, você quer?.

A menina apenas sorriu com uma cara de “Sim, eu quero. Quero que você pare de encher o meu saco”. E eu, boquiaberto com a situação e com a maior certeza do mundo de que eu no ligar da mocinha teria dito para a mulher levantar o traseiro gordo do banco e pedir ela mesma, se ela quisesse a pipoca na janela.