sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

Conversa de capacete


Texto de Matheus Farizatto

A sessão começaria às 16h. São 15h20 e há cinco minutos meu celular toca em som da mensagem com o convite para um cineminha no domingo à tarde. A companhia perfeita. O filme, uma overdose de diazepan. Confesso que é comum meus olhos pesarem sempre que paro um pouquinho, qualquer que seja o lugar, mas com a telona em minha frente, somente em filmes que são mesmo um PORRE.

Mais um, o moto-taxista atendeu dizendo o nome do bairro seguido de “moto-táxi”. É sempre assim, uma falta de criatividade para dar nome aos locais de moto-táxi. Até se chamassem de “Bairro Moto-táxi” seria mais original. Mas não. São cinco toques do telefone e aí vem: “Ipiranga Moto-táxi”, “Centro Moto-táxi”, “Aeroporto” e “Adão do Carmo”. Olha isso, “Adão do Carmo Moto-táxi”, tem como ser pior? Acho que os publicitários fazem campanha para não atenderem empresas de moto-táxi.

Pior que os nomes é conseguir um no domingo. De cinco toques no telefone passa a ser “sua chamada está sendo encaminha para a caixa de mensagens e estará sujeita à cobrança após o sinal”. Não tem moto-táxi no domingo. E se você conseguir um, prepare R$50 na carteira, pois as corridas dobram de preço.

Três números da agenda do celular, dois cartões de visita e uma olhada no poste em frente a casa da minha mãe depois, atende. Na moto: “trabalhamos por conta lá, fazemos o horário que quisermos. Tem cara que não quer saber de domingo, mas cada um faz o seu, né? Eu venho porque a corrida é mais cara, dá pra tirar mais”.

Pronto, está explicado. Jéferson, o último dos moto-taxistas em Ribeirão Preto (SP), em um domingo, não abre mão de trabalhar e muito menos em “dia de ano” quando neste 1 de janeiro colocou na pochete preta R$150.
Há um ano em Ribeirão e com cinco minutos de corrida, na Av. Francisco Junqueira, eu já sabia que as empresas de moto-táxi de RP cobram, em média, R$25 por semana dos motoqueiros que trabalham nestas para “usarem o ponto”.
“A gente paga essa taxa e usa uma pá de coisa. Tem geladeira, ventilador, TV e tal”, conta Jéferson.

Nascido em Itanhaém (SP), viveu vinte anos com a família e mudou-se sozinho pra São Paulo. “Lá (Itanhaém), a gente ganha dinheiro uma vez no ano, quando é temporada. Aí a cidade funciona. Do contrário, não dá nada”. Na capital, o itanhaense chegou, e foi embora depois de dez anos trabalhando como moto-boy. “Em São Paulo só pode ser (moto)boy. Você pode carregar qualquer coisa na moto, do tamanho que for, menos gente. Em São Paulo, moto-taxista é multado na certa”, diz.

Sobre a vida em Ribeirão, Jéferson diz que até o clima é melhor para se trabalhar sobre uma moto. “São Paulo chove demais. E aqui é bem mais de boa. Em São Paulo é aquela loucura. Não daria, por exemplo, pra eu ir te levando e falando com você de boa igual a gente está. Lá é gente vindo de todo quanto é lado. Moto costurando os carros. E é assim, entrou no corredor (de carros), tem que ir buzinando, senão você está perdido”.

Mais perigo, porém mais na pochete preta. Jéferson tira por dia em RP cerca de R$50 em vez de “mais que o dobro” que tirava na capital. “Mas lá também é muito mais caro, as coisas”, termina o moto-taxista.

Quinze minutos depois, após dar uma volta enorme por conta da reforma no shopping, eu pago e o cara me pergunta se estou indo trabalhar. Respondo que não, vou ao cinema. Ele me devolve, “nossa, nem lembro mais o que é isso”. São 15h35 de domingo à tarde.